Entre a Verdade e a Luz

Clara estava presa numa sala fria, cercada por paredes de metal brilhante. O eco dos seus pensamentos ressoava, misturando-se com o ruído das máquinas que constantemente zumbiam, monitorizando cada movimento. Sentia o coração a acelerar ao lembrar-se da missão que havia falhado. O regime havia decidido utilizar as suas habilidades, transformando-a numa arma para os seus próprios fins.

Em frente a ela, estava o 'Refletor', o dispositivo que ela havia ajudado a desenvolver, agora uma extensão do poder opressivo que jurou combater. Clara estava à frente de uma tela, voltada para o seu refletor, enquanto uma voz fria soou pelo intercomunicador.

“Clara, é tempo de demonstrar a verdadeira eficácia do 'Refletor'. Têm-se desvio de memórias no setor 4. Precisas de corrigir isso. Neste exato momento, os teus compatriotas serão a tua prioridade.”

Aquelas palavras cortaram-lhe como um golpe. Como poderia usar o que havia criado contra aqueles que lutavam pela liberdade? A pressão dentro dela aumentava, o dilema moral fazendo-a vacilar. A ideia de alterar as memórias dos seus amigos e compatriotas era um preço que ela não queria pagar.

Ela recordou os rostos dos membros da resistência, especialmente o de Pedro. A lembrança do seu sorriso esperançoso tornava-se um peso, um fardo. Como poderia traí-los assim? A indecisão apoderava-se dela, e enquanto as instruções ecoavam no seu interior, Clara percebeu que não tinha escolha.

“Sei que é difícil, mas tens de fazer o que é necessário. A sobrevivência da resistência depende de ti,” a voz prosseguiu, claramente implacável.

Era verdade. Cada um daqueles que Clara havia chamado de amigo estava em perigo. O regime não hesitaria em eliminar os que se opusessem a eles. Ela tomou um profundo fôlego, apercebendo-se de que a verdadeira coragem seria demonstrada não apenas nas ações, mas nas decisões que tomava.

“Eu não posso fazer isto...” murmurou para si mesma, encarando o dispositivo.

A sua mente tornou-se um campo de batalha. “Clara, tens de encontrar uma forma de os salvar sem causar mais danos. A resistência precisa de ti, e de quem realmente és.” Com essa ideia, um vislumbre de esperança invadiu-a; talvez houvesse uma forma de contornar o sistema, de usar o próprio 'Refletor' contra os que o controlavam.

O dilema que enfrentava agora tinha o poder de moldar não apenas o resultado da guerra, mas também a sua própria identidade. “Se eu alterar as memórias de cada um deles, estarei a anular a sua verdadeira essência?” Clara sabia que alterar memórias significava brincar com as próprias vidas das pessoas.

Os rostos dos seus compatriotas dançavam na sua mente. Cada um carregava uma história, um primeiro amor, uma perda, um sonho não realizado. Clara olhou uma última vez para o 'Refletor'. “A verdadeira esperança não está em apagar o que aconteceu, mas em enfrentar o futuro com coragem.”

Determinada, Clara decidiu que não iria permitir que o regime a transformasse numa marionete. Com um toque firme na unidade, começou a escrever um código, uma nova programação que visava libertar, e não aprisionar.

Se o regime queria usar o 'Refletor', então que o usasse. Mas agora, através dela, não seria um instrumento de opressão; seria uma ponte para a liberdade. Clara sentia uma nova luz a emergir dentro de si, uma certeza de que a luta estava longe de acabar.

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