Os ecos do passado começaram a ressoar com tal intensidade que Francisco mal conseguia distinguir o que era real do que era ilusão. Enquanto trabalhava no sítio funerário, a presença da jovem que exigia sua atenção tornava-se cada vez mais opressiva. As visões eram como flashes de uma vida perdida, uma dança de sombras e luz que se entrelaçavam num emaranhado de dor e desespero.
Uma manhã, enquanto escavava cuidadosamente o solo sob os olmos centenários, as visões tomaram uma nova forma. Ele viu a jovem, com longos cabelos soltos ao vento e olhos que brilhavam com uma mistura de medo e determinação. Ela sussurrava palavras que pareciam flutuar entre os ramos das árvores.
“Eles não entendem! Não podiam saber a verdade!” Ecoou a voz dela, como um lamento distante que atravessava as décadas.
Francisco sentiu um frio atravessar a espinha. A jovem foi acusada de bruxaria, um crime que não apenas a destruíra, mas que também havia marcado a aldeia como um estigma eterno. O medalhão que encontrara pulsava em seu bolso, como se quisesse libertar-se da dor que o envolvia.
Ele lembrou-se das conversas que tinha ouvido na estalagem: murmúrios sobre a velha, a bruxa que morava à beira da floresta, e das tradições antigas que ainda prendiam aqueles que se atreviam a desvendar os segredos do passado. A hostilidade dos aldeões agora fazia sentido. Eles não estavam apenas protegendo suas histórias; estavam tentando esquecer o que poderia ser uma verdade tão aterradora que a própria lembrança era insuportável.
“Quem foi ela realmente?” Francisco questionou-se com a sua mente alvoroçada. “E porque ainda importa tanto?”
As visões tornaram-se mais vívidas. Ele viu o momento da acusação, a multidão enfurecida, os rostos distorcidos pela raiva, e no centro, a jovem, com lágrimas escorrendo pelo rosto. Francisco gritou, chamando por ela, mas seu apelo só fez crescer a tempestade que já se formava no céu, nuvens escuras acumulando-se rapidamente. Era como se o próprio universo estivesse reagindo à sua descoberta.
Quando as gotas começaram a cair, ele encontrou abrigo numa pequena caverna próxima, o eco das batidas do seu coração preenchendo o espaço escuro e húmido. À medida que a tempestade rugia lá fora, ele deixou-se cair, a mente em tumulto.
Na caverna, enquanto observava os artefatos que o rodeavam, algumas relíquias pareciam vibrar com uma energia familiar. Era como se ali estivesse a própria essência da jovem, interligada ao destino dele. Ele percebeu que os habitantes da aldeia não eram apenas espectadores passivos da história, mas sim personagens que guardavam segredos próprios, aqueles que poderiam levá-lo a compreender completamente a tragédia do passado.
“Tenho que saber! Preciso entender tudo isso!”
Com esse pensamento em mente, Francisco decidiu que não poderia recuar. Ele procurou por qualquer pista na caverna — um simbolismo, uma inscrição, qualquer coisa que pudesse ligá-lo ainda mais a essa tragédia e às pessoas que a escondiam. Ele sabia que enfrentaria a desaprovação dos aldeões, mas as verdades ocultas eram uma carga que ele não podia ignorar.
Com cada passo, os ecos do passado tornavam-se mais claros, e enquanto a tempestade rugia lá fora, ele sentia que a verdadeira tempestade estava apenas a começar dentro dele.