Ao escaparem da sala de estar, o grupo foi empurrado para um longo corredor mal iluminado que terminava numa porta de madeira desgastada. Lucas hesitou por um momento antes de empurrar a porta, e, com um ranger agudo, ela abriu-se para uma cozinha escura e malcheirosa. O cheiro era quase insuportável, como carne podre deixada ao abandono durante meses. Panelas e tachos enferrujados estavam espalhados pelo chão de pedra, enquanto prateleiras de madeira cheias de poeira e teias de aranha pareciam prestes a desmoronar.
Pedro torceu o nariz, recuando alguns passos. "Ótimo... agora estamos num filme de terror com cheiro."
Clara aproximou-se cautelosamente de um grande fogão de ferro no centro da sala. Uma velha panela de cobre ainda repousava no topo, parcialmente coberta com um pano queimado. Isabel, sempre atenta a detalhes, aproximou-se de uma prateleira onde um livro de receitas amarelado estava colocado. O título gravado na capa desbotada chamou-lhe a atenção: "Receitas para a Alma".
“Que livro estranho,” murmurou, folheando as páginas com dedos trémulos. As receitas pareciam normais ao início – sopas, estufados – até que se deparou com uma página onde a caligrafia mudava. Clara espiou por cima do ombro de Isabel e leu em voz alta: “Prato da imortalidade... o banquete final.”
De repente, um estrondo ecoou na sala, interrompendo-as. Lucas saltou para o lado, apenas a tempo de evitar que uma faca se cravasse na parede ao seu lado. “Mas o que...?”
As gavetas e armários começaram a abrir e fechar-se com força, atirando utensílios de cozinha e facas por toda a divisão. As portas batiam com uma violência crescente, como se a própria cozinha estivesse a tentar expulsá-los. O grupo recuou rapidamente para o centro da sala, enquanto os objetos se lançavam contra as paredes numa fúria incontrolável.
Rui, que até então mantivera um semblante sério e composto, desatou a correr em direção à saída. “Temos de sair daqui agora!”
As prateleiras começaram a desmoronar-se com o peso dos utensílios que caíam. Lucas e Pedro lutavam para se protegerem das facas que voavam pelo ar. Uma delas rasgou a manga de Lucas, mas ele mal teve tempo de reagir.
Isabel, com o livro ainda na mão, gritou: “A porta!” e apontou para a saída no lado oposto da cozinha. O grupo correu desajeitadamente na direção da porta, empurrando-se para escapar da fúria da cozinha possuída. Quando finalmente atravessaram o portal, a porta fechou-se atrás deles com um estrondo tão forte que fez tremer o chão.
Ofegantes, o grupo encontrava-se agora num outro corredor, iluminado apenas por uma luz fraca que pendia do teto. Pedro encostou-se à parede, tentando recuperar o fôlego. “Isto... isto não pode ser real.”
Lucas olhou para Isabel com uma expressão severa. “O que é que diz mais o livro?”
Com o livro ainda nas mãos, Isabel virou mais algumas páginas, as palavras escuras e perturbadoras dançando à luz trémula. "Acho que este livro não é apenas de receitas... está relacionado com o que está a acontecer aqui."
Clara encolheu-se, ainda a tremer. “Este lugar... é maldito. Não podemos continuar assim. Alguma coisa vai acabar por nos apanhar.”
Lucas assentiu, os olhos fixos na escuridão do corredor à frente. “Não temos escolha. Temos de continuar.”